23/11/2005

TRADUZINDO O ECONOMEZ

   

O momento econômico da vitivinícola.

 Do passado

          Muito se escreveu sobre o setor vinícola. Folhando os jornais de Bento Gonçalves dos idos de  1950 a 60, encontramos artigos escritos por diversos expert sobre as mesmas dificuldades de produção da uva, do vinho e sua comercialização. Praticamente todo o vinho produzido naquela época era consumido no estado. O pouco exportado para outros estados era colocado em barris de 100 e 200 litros e transportados muitas vezes por trem. Sempre que se percorre as cantinas da região, nas mais antigas, encontramos fotografias com estes relatos. Por oportuno, registramos que Bento Gonçalves já teve um jornal denominado “Capital do Vinho”, tamanha a importância e participação do vinho na sua economia.

Dos últimos doze anos

          O setor vinícola iniciou o aumento de sua densidade a partir de 1993, onde com o ingresso de novas tecnologias na área de vinificação, exigiram do produtor, outros conceitos de matéria prima, cujo foco passou a ser a qualidade e não mais a quantidade. Se buscarmos identificar o conjunto de agentes de inovação tecnológica neste período, as entidades educacionais e de pesquisa do setor foram os sustentáculos de toda esta mudança. Com a qualidade dos produtos vieram às demandas e o estoque que ficava em média três a quatro anos em processo de maturação, passou a ser consumido no ano seguinte da sua elaboração, o que chegamos nos dias de hoje, ao consumo maduro no próprio ano de produção.

          Os derivados da uva tiveram grande participação na educação de novos consumidores, principalmente entre os jovens,  que se lançaram como uma ameaça à cerveja pelos cítricos misturados ao vinho, que felizmente ficamos longe disso. Pensamos ser utópico o vinho ser um produto popular, no nível de sofisticação que hoje é apresentado.

          A estatística da UVIBRA nos mostra que os importados, no período de janeiro a setembro deste ano, representam 62,3% dos vinhos comercializados e que o Chile sozinho, representa 33% da importação ou 20,6% do total do vinho comercializado no mesmo período, incluído aqui os vinhos nacionais (37,7%). Só para constar, do vinho comercializado nestes nove meses de 2005, somente o Chile e Argentina venderam mais no Brasil  do que os vinhos nacionais.

 Paralelos a isto encontramos uma grande quantidade de vinhos estocados de produção nacional, de excelente qualidade, que embora diferentes, são tão bom ou melhores que os importados, sem deixar de ser diferente.

Este cenário ilusório de mercado satisfeito tem alguns ingredientes perigosos – principalmente o desestímulo da produção nacional. Já assistimos no passado, produtores de uvas cortarem suas plantas em substituição por outras lavouras, pela falta de expectativa financeira da venda de seus produtos. Sabemos também do incentivo de outros países para a agricultura, mas também temos consciência que estamos longe deste momento, cujo vilão é a carga tributária, diante de um programa inerte ao setor. 

Mas toda esta conversa está para alertar o produtor de uvas, o pequeno e médio produtor. Os sindicatos, os órgãos de pesquisa e congregadores dos profissionais da área vitivinícola intensificaram sua preocupação com a condição técnica e econômica do agricultor e que o aspecto tecnológico superou as expectativas, mas o negócio em si, como meio de subsistência e bem estar, não atendeu na mesma proporção.

 Do produtor de uvas

          O cenário que se aproxima é  a incompatibilidade dos minifúndios, ou seja, propriedade fracionada com produção em até quatro hectares (ou próximo), tenderão desaparecer – ou se incorporam em outras organizações empresariais do mesmo ramo ou a migração para a cidade está decretada em busca de outros recursos de subsistência.

          A exemplo de outros países, a tendência brasileira das pequenas economias da região é: (i) de se fundirem para formar uma grande corporação (como numa cooperativa ou mesmo numa sociedade empresária) ampliando sua produção para trazer um viés de resultado através da verticalização dos seus negócios; (ii) aumentar o foco na vitivinicultura, incorporando outras áreas de plantio para dentro da economia familiar, fortalecer seu negócio; (iii) migrarem para outras áreas de negócio, tais como hospedagem e hotelaria, alimentação ou mesmo artefatos agrícolas ou artigos com características da região fomentada pelo turismo, que também é uma grande alternativa; (iv) ou deixarão espaço para outros empreendedores, migrando para os centros mais urbanos.

          Grandes áreas de plantio se espalham pelo país, dando a idéia de que num curto espaço de tempo mais que dobraríamos a produção. Grandes investimentos foram feitos na necessidade clamada pelo consumidor nacional de produtos de alta qualidade. A agricultura e a indústria vinícola nacional deram a resposta, na altura dos excelentes produtos mundiais.

 O poder da articulação

          Não obstante ao descaso das autoridades que detém o poder de regular, o setor não se deixou levar pela conformidade da batalha perdida. A articulação continua e deve ser incentivada, não só a níveis de órgãos do setor, mas a nível político, pois é lá que acontecem as coisas.

Esperar um momento de melhoria de credibilidade da classe política, talvez o setor não chegue a tempo, pois temos belos anos por assistir a um aumento da confiança dos que regulam as relações jurídicas deste país.

O setor já é forte pela representação econômica e social, mas deve aumentar o processo de união e articulação política. Esbravejar e demonstrar indignações em foros não privilegiados só traz instabilidade. A indignação deve ser mostrada em processo de persuasão no foro de decisão das políticas públicas e sociais. Talvez as vozes isoladas se unam, não para numa só voz, mas para que os discursos sejam uníssonos e com tom de clamor, pois ainda somos levados por sentimentos. Se a razão fosse um dos pilares, não haveria necessidade de comportamento mendigatório da classe.

 

Enio Gehlen – Economista e Contador
GEHLEN CONSULTORES
http://www.gehlenconsultores.com.br

 

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